domingo, 2 de setembro de 2007

Lugares imaginários


Outro dia contei que com a quinta série faço um tabalho longo, onde eles criam um mundo imaginário.

Há um livro maravilhoso, O Dicionário de lugares imaginários, de Alberto Manguel e Gianni Guadalupi, onde estão mapeados e decritos, com direito à mapas e tudo, os grandes lugares imaginários da literatura. Quase um guia de viagem, para mim é, principalmente, um guia sentimental, pois os lugares mais significativos que freqüentei trazem consigo lembranças, memórias de quem eu era à época, de quem sou, dos meus sonhos. Vivi e vivo em um monte desses lugares, são como casas em que eu morei, com a vantagem que continuam lá, e podem ser revisitadas sempre.
Cresço, e levo esses lugares comigo. Sempre fujo para lá, cada fase, um lugar.

A edição brasileira foi acrescida de alguns verbetes de lugares da nossa literatura, um deles sobre o lugar que mais me acompanhou na infância, O Sítio do Picapau amarelo.
Reinações de narizinho talvez tenha sido dos livros que mais li e reli, decorei o início, lia comendo jabuticabas, e ora era a Narizinho, ora a Emília. Acho que até hoje continuo assim, ora Narizinho, ora Emília.

Outro lugar também muito frequentado por mim na infância foi a Grécia antiga, repleta de deuses, monstros e heróis. Ora era Afrodite, linda, a deusa do amor, ora Artemis, livre, a deusa da caça, dos animais e da natureza. Queria também ser Atenas, a deusa da sabedoria, que nascera da cabeça de Zeus. Sou as três. Vivi muito no labirinto do Minotauro, nos campos gregos, percorri palácios, conheci o Hades e o Olimpo.
Eu amo esses lugares.
Que venham novos.

Deixo com vocês o verbete sobre o Sítio, com as dicas todas sobre o pó de pirlimpimpim.

SÍTIO DO PICA-PAU AMARELO - Propriedade rural de não mais de cem alqueires de terra rica em petróleo,situada em lugar bonito do interior do Brasil. Sabe-se quedista légua e meia da vila mais próxima, mas sua localizaçãoexata é desconhecida, pois a proprietária, dona Benta Encerrabodesde Oliveira, impede a divulgação do endereço. A sede do sítio,uma casa branca de cômodos espaçosos e frescos, possui quatro quartos: o maior, de dona Benta, o de sua neta Narizinho, o de Pedrinho, primo de Narizinho que lá passa as férias, e o de tia Anastácia, a cozinheira e faz-tudo da casa. Em um canto do escritório, onde ficam três estantes de livros e a mesa de estudo da menina, moram a boneca Emília e o sabugo de milho conhecido como Visconde de Sabugosa. A sala de jantar é bem ampla, com janelas dando para o jardim; depois vêm a copa e a cozinha. A residência dispõe ainda de uma sala de visitas com piano, sofá de cabiúna e palhinha bem esricada, duas poltronas do mesmo estilo e seis cadeiras. A mesa de centro é de mármore e pés também de cabiúna. Na entrada, há uma sala de espera, com chão de grandes ladrilhos "cor de chita cor-de-rosa desbotada", que se abre para uma varanda muito gostosa. Cercada por gradil de madeira muito singelo, pintado de azul-claro, cheia de orquídeas e vasos de avenca miúda, é onde do na Benta costuma sentar na cadeira de balanço, com a cestinha de costura ao colo e óculos de ouro na ponta do nariz. Da varanda desce-se para o terreiro por uma escadinha de seis degraus. O jardim, nos fiândos da sala de jantar, é composto por plantas antígas e fora de moda. No seu centro, há um tanque redondo comum a cegonha de louça toda esverdeada de limo, que deveria esguichar água pelo bico, mas o bico e até a cabeça foram vítimas das pelotadas do bodoque de Pedrinho. Nos fundos da casa, depois do "quintal da cozinha", do galinheiro, do tanque de lavar roupa e do puxado da lenha, encontra-se o pomar, com a famosa pitangueira da Emília, as três jabuticabeiras de Pedrinho, a mangueira de espada de Narizinho e os pés de mamão da tia Nastácia.

O terreiro é vedado por uma cerca de paus a pique e uma porteira, bem no centro. Para lá da porteira fica o pasto, onde há um célebre cupim de metro e meio de altura; e mais adiante, um velho cedro, ainda do tempo da mata virgem.

O Sítio do Pica-Pau Amarelo costuma ser visitado por personagens das fábulas, da mitologia, do folclore e da literatura infantil, bem como por nobres da estirpe de Don Quixote de la Mancha. Recentemente, dona Benta adquiriu mais 1200 alqueires de terras vizinhas para ali instalar o Mundo da Fábula.

O visitante não deve deixar de provar as jabuticabas e os bolinhos de polvilho de tia Nastácia. Aconselha-se a consumir com moderação o pó de pirilimpimpim, guardado pelo rinoceronte Quindim e administrado pelo burro falante Conselheiro. Trata-se do pó mais mágico que as fadas inventaram, que deixa a pessoa leve como pluma, tonta, dá uma zoeira nos ouvidos e conduz ao País das Fábulas e ao Mundo das Maravilhas. Mas deve-se tomar cuidado para não molhar o pó com água salgada, pois cessa o efeito.

(José Bento Monteiro Lobato, 0 Saci, São Paulo; 1921; Reinações de Narizinho, São Paulo, 1931; 0 Picapau Amarelo, São Paulo, 1939)

3 comentários:

  1. Bem, em "Caçadas de Pedrinho", fala-se nas proximidades do Sítio da Estrada de Ferro Central do Brasil, o que me faz pressupor que o lugar fica no Vale do Paraíba paulista, provavelmente Taubaté, região aonde o autor nasceu. ;-)

    ResponderExcluir
  2. Eu amo o sítio até hoje. Mas jamais aquela visão deturpada da tv!

    ResponderExcluir
  3. :: olá! adorei seus títulos... encontrei-te nesse caos meio sem querer ou sem prever... procurava cronópios e famas... enfim. não te conheço, mas cuide-se e fique bem! =^.^= ::

    ResponderExcluir