quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

começam as aulas

Amanhã começam as aulas.
Uma semana antes do carnaval. Coisas do calendário escolar...

Tenho saudades dos meus alunos, e ao mesmo tempo, tenho um pouco de medo. Minha vida mudou tanto nessas férias, eu mudei tanto, que nem sei. Vou ver como estou ali também. Poruqe a lulu que terminou o ano é diferente da lulu que começa o ano. Mesmo. As mudanças internas foram mais longas, é claro, mas estou diferente, minha vida está diferente. Será que estarei diferente na sala de aula?

De qualquer maneira, a cada ano entro na sala de aula, para o primeiro dia de aula, como se fosse a primeira vez.
Todo ano, fico nervosa e ansiosa.
Todo ano, há dez anos, a primeira pisada na classe parece ser definitiva. Tento ser muito muito brava e assustar muito todo mundo. Raramente consigo.

Neste ano, durante as férias, nem pensei na escola. Me constituí e reconstituí de jeitos que não incluíram o estar na sala de aula, escrevi muito, arrumei minha casa, fiz milhões de aulas de dança, conheci pessoas, comecei a morar sozinha. Tudo mudou, mas meu trabalho cntinua exatamente o mesmo, e isso também me dá uma certa estranheza.
A sala de aula é o meu lugar.
Um dos meus lugares.
Um lugar que talvez também tenha que ser reinventado.
Ou não. Não sei ainda.

Para ser uma boa professora é necessário um grande nível de doação. O bom professor, na sala de aula, não olha para si mesmo e sim para os alunos, e abre, com generosidade, caminhos para que eles possam crescer e aprender. Se a gente tá muito auto centrado, muito inseguro ou muito envaidecido, muito preocupado com algo ou muito distraído, é difícil as ulas saírem boas. Pelo menos comigo é assim. A hora de entrar na sala de aula é a hora de esquecer meus problemas pessoais e me focar e concentrar naquele momento. E aquele momento é dos alunos.

Eu levo minha profissão muito à sério, me sinto muito responsável por coisas importantes na vida de muita gente. Para o bem ou para o mal.

Quanto mais novo o aluno, mais importância os professores têm. Por uma série de razões. É claro que aquele super professor na faculdade pode transformar nossa maneira de ver o mundo, apresentar novos universos e tal, mas aí, de certa maneira, já estamos formados.

Quem cuida do seu filho de cinco anos de idade é alguém muito, muito importante na vida dele.

Há uma inversão cruel de status e salário na carreira de um professor que faz com que os professores que lidam com crianças menores sejam os que ganham pior, e o salário aumenta na medida em que aumenta a idade, e o nível dos alunos. E a pessoa se forma mesmo quando criança. Professores do fundamental 1 são muito mais determinantes para a formação de alguém do que qualquer professor do endino médio. Muitos pais entram também nessa lógica e investem tubos de dinheiro para colocar o filho no ensino médio mais caro da cidade, enquanto o filho mais novo vai ser alfabetizado na escolinha perto de casa, tá bom... ele é criança ainda. As crianças bem formadas desde pequenas são geralmente os melhores alunos em qualquer nível que venha depois. Até a faculdade. É claro que estou sendo bastante fatalista aqui, e há mil histórias de virada, intelectual e moral, ao longo da vida de cada um. O que eu queria dizer é que um professor de quinta série, sexta, sétima, oitava é alguém que pode marcar muito a vida de alguém. E em português isso fica muito evidenciado e forte. Porque trabalha-se com escrita e leitura, com a fala e os vários tipos de comunicação, com a relação da pessoa com o mundo e consigo mesma, com as possibilidades de expressão e construção dessa relação. Isso não é pouco.


Quando faço meu planejamento anual penso nessas coisas. Porque não quero, nem posso, me eximir dessa responsabilidade. Na escola em que leciono sou responsável pelo curso de português inteiro do fundamental 2. Dou aulas da quinta à oitava série, de redação, gramática e literatura. O moleque vai me ver quase diariamente por quatro anos da vida dele. Eu tenho que fazer o meu melhor. Dar um curso que forme os alunos, como leitores, escritores e donos da sua linguagem.

E todo começo de ano me dá uma tremedeira. Uma insônia na véspera da primeira aula. Um medo de que nada vai dar certo.

Uma vontade de que amanhã já chegasse logo, e uma saudade de ouvir o sinal, pegar minha caixinha de giz, e voltar logo para a sala de aula.

12 comentários:

  1. ai ai, também tô com frio na barriga mas as minhas começam só em março, parece (vou saber direito isso só no dia 11)
    boa sorte, hoje
    :)

    bjos

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  2. Oi Mulher, você sumiu, desde a semana passada não escreve, não sei daí, mas aqui em BH chove a dias, já estou mofando....Nem sei como conheci seu blog, só sei que foi através de outro....Parabéns adorei demais...Também já fui professora de ensino fundamental,mas trabalhava mesmo em uma ´escolinha´, mas como o salário é inversamente proporcional ao prazer de dar aula para os pequenos, me entreguei á ganancia do mundo e hoje sou eng. civil, mas ainda encontro meu lugar no mundo...um beijo e bom começo de ano para você, SEJA FELIZ....

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  3. Oi Lulu! Que delícia deve ser mesmo hein? Não vejo a hora de ter as minhas turmas!!!! Eu imagino como teus alunos esperam ansiosos por ti, pelas tuas aulas geniais!
    Queria que você desse algumas dicas pra trabalhar gramática!
    Beijo
    Thais - Poa

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  4. Entendo perfeitamente, Lu. Todo ano, cada sala nova é a uma enorme sensação de medo e de felicidade. Boa sorte, linda.

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  5. Lulu,
    Acho o magistério lindo, por todas as considerações que você colocou. Particularmente a pergunta que você coloca no início, quando se questiona se ainda será a mesma depois de tantas mudanças, me fez pensar. Será que não mudamos sempre, diariamente? O que aconteceu com você é que houve um acúmulo de fatos importantes em pequeno espaço de tempo. Isso talvez tenha acelerado um pouco a velocidade normal das mudanças. Na excência, porém, acredito que continuamos o mesmo. Tudo o que aconteceu não mudou a Lulu básica, aquela professora que ama os alunos, literatura, ensinar. Logo, passada a excitação da primeira aula, essa dificuldade inexplicável (talvez pela lei da inércia conseguíssemos) que temos com o novo, você terá o domínio completo da sala de aula e deitará e rolará, como sempre.
    Grande beijo

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  6. Lulu,

    Se eu tivesse tido uma professora como você, eu teria me interessado pelos livros muito mais cedo. Pelo menos uns 10 anos antes.

    Segui a dica que você me deu quando fomos almoçar e comprei o Crime e Castigo da editora 34. Eu o estou lendo agora. Está sendo delicioso. Uma boa tradução faz toda a diferença.

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  7. oi Lulu.

    aiai,se todos os professores fossem assim. Faço letras, não sou o melhor aluno, mas tenho medo das cabeças que de lá saem.Muitos dos meu colegas simplesmente não lêem nada, apenas o texto base e olha lá.
    daí fico com os meus botões; se o professor é assim, imagine o aluno que ele vai formar?
    O que faz com que outro mecanismo perverso do ensino se manifeste. Os piores profissionais acabam ensinando os alunos de base, e o que é pior, o ensino de base público.
    Infelizmente no interior é assim.

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  8. puxa!
    Oxalá meu filho tivesse uma professora como você...

    Mesmo numa escola particular (a qual me esforço para pagar) percebo um total desapego dos professores pela profissão e, principalmente, pela aprendizagem dos alunos...
    É um verdadeiro mercado: apostilas caras e vazias.

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  9. Fiquei emocionada com esse texto. Adorei seu blog.

    Abraços

    Maria

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  10. Lulu, adorei o texto, me identifiquei. Sou professora de história e responsável por todo o fundamental de uma escola.
    Por quatro anos os meninos vão decidir se amam ou odeiam a disciplina e na maioria das vezes isso só depende de mim.
    é estranho, gostoso e exige muita responsabilidade. A escola é único espaço que exige que eu me reinvente sempre.Nos outros eu até posso empurrar com a barriga. Menos na escola.

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  11. pois é Cecy,
    é isso aí. na sala de aula não ´dá para não estar inteira !
    beijo!
    lulu

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