quinta-feira, 16 de agosto de 2007

dia gris

Então há dias em que a melancolia toma conta do mundo e das coisas. Vem quase sem aviso, ou já estava guardada ali, em algum lugar do corpo, prestes a expandir-se e entrar pelos pés, pela ponta dos dedos das mãos, cobrir o crânio, e penetrar nos ossos. E parece, então, que todas as vontades se acabam. Nesses dias, respira-se porque é automático, e as células e tudo o mais continuam funcinando porque sim. Nesses dias a cabeça curva-se, os ombros caem, e olha-se para baixo, e o mundo parece algo distante e estranho.

Uma voz, distante e externa fala assim que tudo está certo, que não há sentido na melancolia. E não há. e daí? Os prédios que vejo da minha janela parecem vazios, assim como tudo o mais. Em dias assim, é melhor esperar que passe, sentada num canto branco da casa, sem concentração nem para um livro, uma linha, uma palavra. Há dias assim. Há outros dias. eles vêm também, eu sei, mas esses dias são bem de verdade. e parecem me dizer algo que eu ainda não sei ouvir, enquanto olho para baixo e tenho um pouquinho de medo.


Joseph Mallord William Turner (English, 1775-1851), Moonlight, a Study at Millbank, 1797, oil on canvas, Tate Museum, London

O caminho de saída para dias assim é de ação, sair pela rua, ir ao cinema, aula de ginástica, sapatos novos, trabalho. pode deixar, eu sei. mas, tem dias que ficam assim.

10 comentários:

  1. Lulu,

    Nestes dias assim, que sempre existiram e sempre vão existir, pra estes dias, nada melhor do que aceita-los como um pedaço da nossa inquietude, pois se está tudo bem, ou aparentemente esta, ou deveria estar, porque algo sempre grita neste dias que não? Juro que queria entender dias assim...

    Beijos,
    Miranda

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  2. Lulu,

    A melancolia está dentro da gente. O dia cinzento só cataliza a sua exposição.

    A única solução pra este problema está no título do seu post anterior.

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  3. Meu dia de hoje foi ridiculamente péssimo. E está gris lá fora. Pior, está medonho. De dar medo.

    Beijo.

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  4. Lulu, coloca isso no blog e o dia melhora.;0)

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  5. "...Um dia, a monotonia tomou conta de mim
    É o tédio, cortando os meus programas, esperando o meu
    fim

    Sentado no meu quarto
    O tempo voa
    Lá fora a vida passa
    E eu aqui a toa
    Eu já tentei de tudo
    Mas não tenho remédio
    Pra livrar-me deste tédio"

    Biquini Cavadão

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  6. Lulu,

    Não sei se é pertinente, mas relacionei seu post com esta crônica da Ana Miranda (transcrevo partes dela):

    A permanência das coisas

    Subi uma alta serra que se chama da Tormenta, ao sul de Minas, e foi ali que me veio uma pergunta: o que passa e o que fica? Ali do alto onde tudo se avista, onde o vento mostra a sua força e as nuvens sua amplidão, ali eu me interroguei, porque a serra tem a mansidão da eternidade feita de pedra, e a aldeia a seus pés, Carmo do Rio Claro, tem a calma da infinitude. Ali as pessoas nascem devagar, andam devagar, olham longamente, se debruçam nas janelas, conversam sobre as minúcias, cruzam solenes as ruas, se amam com lentidão. Infinitamente fabricam doces eternos, observam a vida a se consumir nas achas do fogão a lenha, a escoar no soro do queijo branco, e a vida parece que não passa, ou passa sem se perder, passa na procissão, morrem os momentos devagar e calmamente, como se não morressem. E as noites, completas, com a reticência das estrelas. E todas as dores cabem num coração. E tudo cabe numa pequena igreja, glória feita de mistério.

    Será que uma aldeia pode perpetuar nossa vida? Será que uma geografia pode nos eternizar? Será que uma serra para sempre existirá? Até quando tudo existirá? Alguém que nasceu aos pés de uma forma perene sente tudo permanecer? Serei eu tão móvel porque nasci diante de um oceano? Tudo passa? Tudo fica? Será que a passagem das coisas é apenas um sentimento? Perguntas ao vento, que ninguém responderá. (...)

    Uma serra desenhada no horizonte guarda a idéia da mais lenta evolução. Depois que subi essa serra, entendi alguns seres que se demoram a viver, pensam antes de responder, hesitam antes de decidir, eles têm em seu coração a permanência do instante.

    [texto extraído do livro “Deus-dará”, de Ana Miranda, Casa Amarela, 2003, pp. 222-223]

    Seu dia gris também me remeteu, de cara, a esta canção de Djavan (pra ouvi-la, clique no título):

    Nem um dia
    Djavan

    Um dia frio
    Um bom lugar pra ler um livro
    E o pensamento lá em você
    Eu sem você não vivo

    Um dia triste
    Toda fragilidade incide
    E o pensamento lá em você
    E tudo me divide

    Longe da felicidade e todas as suas luzes
    Te desejo como ao ar
    Mais que tudo
    És manhã na natureza das flores

    Mesmo por toda riqueza dos sheiks árabes
    Não te esquecerei um dia
    Nem um dia
    Espero com a força do pensamento
    Recriar a luz que me trará você

    E tudo nascerá mais belo
    O verde faz do azul com o amarelo
    O elo com todas as cores
    Pra enfeitar amores gris

    Bjão,
    Clé

    Linda a ilustração do post. Gris. Como o seu dia.

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  7. Nossa. Turner. Mesmo retratando um dia tenebroso e agrisalhado, é impressionante como um quadro dele nunca deixa de me animar.

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  8. Lulu,
    Eu fico freqüentemente assim. Só melhora se vou para a academia, ao parque correr. Endorfina ajuda.
    Beijo

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  9. E quando não passa?

    E quando parece que não queremos que passe? Que entramos de vez neste jogo sórdido dos dias cinzas e das coisas vazias e tudo que vc tente fazer não adianta e nada tem graça. Nada. Nem aquele livro, nem aquela flor linda que vc estava esperando meses paraque abrisse nem um dia de sol e nem nada. Você só quer ficar flutuando no nada e pronto? Ainda bem que eu não acredito em depressão. Ainda bem que eu sei que uma hora dessas passa ou eu passo antes disso, sei lá.

    Abraço!

    Janaína.

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