quarta-feira, 6 de junho de 2007

ainda sobre desobediência civil

E meu querido Miranda comentou e escreveu assim:

"Pensando profundamente sobre o tema, cheguei à conclusão de que o que mais me incomoda nisso tudo é que estes moços e moças tão cheios de vida e sonhos têm uma capacidade incrível de mobilização e deveriam correr atrás do possível, mesmo que consigam um possível por vez pois assim construiriam um legado, um verdadeiro legado que jamais seria apagado. Eles PODEM E DEVEM fazer isso, mas ao meu ver seguindo a leglidade sempre, pois nosso país não é injusto apenas com suas universidades concorda? E aí o que faremos? vamos semear atos de desobediencia civil pra cada injustiça social?"

( esse é um pedaço de um diálogo que está aqui. E que dá continuidade a uma outra conversa, com a Meg, que está por aqui)


Sabe Miranda, qual é minha resposta para sua pergunta final?

Sim.


Talvez devêssemos sim semear atos de desobediência civil para cada injustiça social.

A cidade talvez devesse parar para e por cada criança que está fora da escola, pedindo dinheiro no sinal, para cada pessoa que mora nas ruas, para cada doente que padece nas filas dos pronto socorros, para cada doente sem tratamento digno e imediato, para cada nova notícia de corrupção, de desvio de verbas públicas, e assim por diante. Cada aluno que está na escola e não consegue se alfabetizar, cada um que passa fome, que não tem lazer nem cultura...

Qual morte de criança merece uma revolta?

Vamos pouco às ruas. Desobedecemos pouco. Nos revoltamos pouco, protestamos pouco, sentimos pouco, ligamos pouco.
E eu me incluo totalmente dentro disso. Não faço nada.

A população devia ir às ruas porque não tem escolas públicas boas para seus filhos, porque não tem um sistema de saúde pública decente...

Fico pensando se, por exemplo, não pagássemos tão rapidamente escolas e sistemas particulares de saúde e lutássemos mais pela melhoria da coisa pública, as coisas não iam ser diferentes.

Talvez, com mais movimentação, com mais revolta, com mais ação, com mais não aceitação, barulho, incômodo, as coisas de fato pudessem mudar...

Na escola, uma funcionária da cantina estava dizendo que quase morreu, ontem. O ônibus em que ela estava, um ônibus velho, daqueles que fazem as linhas da periferia da cidade, pegou fogo. As portas travaram, todo mundo entrou em pânico, desceram pelas janelas. Eu perguntei:
- e aí?
e aí nada, todos continuaram suas vidas, foram aos seus trabalhos, e amanhã pegarão o mesmo ônibus velho e sem manutenção.

Não sei... fico achando que deveríamos ser mais desobedientes...

De preferência com inteligência e, se possível, sem autoritarismo, como quis o Interaubis, mas aceitamos esse mundo com muita facilidade...

atualização:
uma das prisões sobre as quais o Alex escreve é justamente a da obediência e respeito. É a visão do Alex sobre isso, bem própria, individual, e vale a pena ser lida.

8 comentários:

  1. Concordo.

    Acho que perdemos aquela capacidade que tínhamos quando crianças de nos espantar com tudo.

    De observar tudo a nossa volta.

    Pode parar pra analisar como uma criança e também como um gato se comporta ao entrar em um novo ambiente: eles olham para todos os lados atentamente.

    Nós não olhamos nem para fora nem para dentro, onde realmente estão as respostas.

    Obediência civil?

    Diria que isso é mais uma forma de nos manter comportados, ordenados, pacíficos. Nós brasileiros somos tão gente boa que toleramos até oq ue não devíamos.

    Se acho que então o negócio é partir para a ignorância?

    Não, não sou fã de extremismos e sim do caminho do meio: o equilíbrio.

    Romantismos? Utopias?

    Mais romântico é aquele que foge da realidade em seu bom mocismo.

    Acho que é isso.

    Abraço!

    Janaína.

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  2. “E eu me incluo totalmente dentro disso. Não faço nada.”. Não faz nada, Lulu? Escrever mostrando um problema, refletindo sobre uma situação já não é fazer alguma coisa? Se não fosse o Thoreau escrevendo sobre A Desobediência Civil, certos protestos, certas atitudes não seriam possíveis pouco depois. O José Martí, que ajudou tanto a independência de Cuba com seus textos, não teria ajudado muito mais se não tivesse se metido no campo de batalha para lutar contra os espanhóis e morrido. Creio que escrevendo ele era mais importante do que como soldado. Escrevendo, ele fazia mais.

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  3. Lulu,

    Dialogar com você é mais que um prazer, é um privilégio se eu acreditasse em vidas passadas e futuras eu gostaria de vir Lulu na próxima, só pra ter a sua clareza de ideias, eu me perco muiiito!

    Agora saiba que eu jamais quero perder a minha capacidade de me indignar com todas as nossas mazelas sociais e sim, gostaria muito de ver mais "desobediencia" por ai. Mas será que pra no insurgirmos precisamos realmente cometer atos ilegais? Lanço aqui uma pergunta: 0s generais que mergulharam o país em uma ditadura por tantos anos não seguiam uma linha de raciocinio no minimo parecida? Tipo "Olha, não estamos satisfeitos com a condução dos rumos da nação e o debate não cabe mais. Vamos agir pela força!). Eu quero sim, me insurgir, quero sim, gritar, brigar, protestar, mas sempre dentro dos limites da legalidade. Ainda acho que podemos mudar o país pelo voto, pela nossa conduta, pela mudança que começa na minha casa. Agir local pra mudar global.

    Protestar, me fazer ouvir, tranformar minha indignação em arma de guerra, mas uma guerra limpa. Porque eu quero construir sim, um mundo melhor pra minha filha e pros meus netos que virão.

    Deixo mais uma pergunta: Será que nós que nos indignamos diarimente com nossa situação não deveriamos começar a ir além de nossa indignação. E, sendo ingenuo eu sei, neste mundo capitalista e cinico que vivemos fazer trabalho voluntário por exemplo em uma escola pública é um ótimo exemplo de desobediencia as regras estabelecidas não acha?

    Beijos,

    Miranda.

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  4. Miranda, eu achei interessante teu questionamento: "Será que nós que nos indignamos diarimente com nossa situação não deveriamos começar a ir além de nossa indignação."

    Eu digo que sim, que nos indignar, nos espantar, nos inquietar é só o primeiro passo, que nem passo é, mas há aqueles que nem isso conseguem mais.

    O segundo passo seria deixar a indig e ir para a ação mesmo.

    Não consegui detectar em tua última fala, sobre o trabalho voluntário, se estava sendo irônico ou realmente falava a sério.

    Se fala a sério eu digo que pequenas ações ajudam mais que grandes debates, às vezes.


    Se está sendo irônico eu digo que realmente trabalho voluntário mais afaga nosso coração e nossa alma do que ajuda o próximo, não que não deva ser feito, mas devemos observar bem a forma de se fazer.

    Por que ONG já virou mercado da miséria, a África já está pedindo para parar de ajudá-la, pois está criando uma máfia no país e não deixando que ele se desenvolva.

    Mas estes são casos específicos, acho que podemos fazer muito se começarmos por nós mesmos.

    Posso ser ingênua, mas acredito que se melhorarmos a nós mesmos como seres humanos e sociais reverberaremos isso a nossa volta através de nossas atitudes.

    É o que tento fazer...pq SÓ dar roupa, comida e trabalhar de graça não adianta, em minha opinião, se continuamos sendo pessoas fazendo pequenas maldades em nosso trabalho, em nossa casa e enfim.


    Abraço.

    Janaína.

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  5. Janaina,

    De modo algum estava sendo ironico sobre o trabalho voluntário. Acho que temos que fazer sim, mas não sou fã de Ong´s não.n Acho que viraram corporações como qualquer outras uo pior que outras, pois usam da boa vontade alheia. Claro que não todas, mas a maioria.

    Beijo

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  6. Ah tá, essa é a dificuldade do meio virtual, não poder se valer da entonação dada a fala...aí, às vezes, a gente se perde mesmo nos efeitos de sentido...rs

    Abraço.

    PS: Vc já assistiu Quanto vale ou é por quilo?

    É um filme brasileiro que fala sobre esta máfia de algumas ONGs, se interessar, fica aí uma dica.

    Janaína

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  7. Lulu, queria só deixar um comentário no espírito do que disse lá no Biscoito: parabéns a você, à Meg, à Janaína, ao Miranda e aos outros leitores pelo debate desarmado, respeitoso, produtivo que construíram aqui. E obrigado pelas referências às minhas escrevinhações. Coincido com você em que a desobediência civil é, sim, um recurso legítimo. Beijos,

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  8. Idelber,

    obrigada, em meu nome e em nome da tchurma!!
    Eu, de fato, tenho leitores sensacionais. E, puxa, é tão bom debater!
    sabe, eu ainda tenho que responder a última pergunta do Miranda, queria falar do Agambem que vc citou outro dia... vamos ver!

    Um beijo grande,
    e obrigada à vc.

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