sexta-feira, 9 de março de 2007

7)Os alunos têm direito a professores ultra bem remunerados e com tempo para dedicarem-se a eles.

Leituras: os direitos do aluno leitor e não leitor. (7-7)


Inspirada por um post do Rafael Galvão e outro do Alex, sobre a leitura na escola e os livros infanto-juvenis, decidi escrever um texto sobre o que penso sobre tudo isso, que acabou se transformando em uma espécie de manifesto, pelos direitos dos alunos leitores e não leitores. Ficou um texto longo, bastante pessoal, que publicarei aqui aos poucos, um por dia, em meio ao dia a dia do Diário da Lulu.

No total, os direitos são esses ( basta clicar em cada um que o post aparece) :

1)O aluno não precisa gostar do livro lido.
Inclusive, é livre para odiá-lo.

2)Ao aluno deve ser oferecido sempre o que há de melhor na literatura universal, passando por todos os gêneros.
3)A literatura não é objeto santificado, sagrado nem de culto máximo.
4)Livros inteligentes devem ser tratados com inteligência.
5)Se o aluno não lê nada, mas nada mesmo, é porque, provavelmente, não sabe ler.
6)Os alunos têm direito a excelentes bibliotecas e a livros baratos.
7)Os alunos têm direito a professores ultra bem remunerados e com tempo para dedicarem-se a eles.


7)Os alunos têm direito a professores ultra bem remunerados e com tempo para dedicarem-se a eles.

Porque depois de tudo isso, sempre vem alguém que diz: viu só? Os alunos não lêem, ou não gostam de ler, ou saem semi-analfabetos das escolas porque as professoras (e aí deixamos de ser professores e viramos professoras) são mal preparadas; ou mesmo mal comidas, não têm vontade de ensinar, não são motivadas, sei lá.

As professoras e os professores são mal preparados simplesmente porque ganham muito mal. Ponto. Não há cursos, reciclagens ou mesmo força de vontade e idealismo que supere, de uma maneira sistemática e significativa, o fato de que com salário baixo, baixíssimo, os professores são sim, seres exaustos, sacrificados, extenuados e muitas vezes mal formados. Antes de criticar qualquer fulano que dê qualquer coisa de qualquer jeito para seus alunos, que não percebe as dificuldades individuais de tal menina ou menino, que vive de mal humor e talz, há que se aumentar o salário e melhorar as condições de trabalho desse fulano, principalmente se tal fulano trabalhar na rede pública.

Tenho ódio profundo de qualquer política educacional que não leve em conta um aumento significativo e sistemático do salário do professor. Dá uma vontade de falar para os políticos que criticam os professores, alegando falta de motivação ou formação e até mesmo boa vontade ( e são tanots!): “ah é? Então vai lá, ser professor.” E a pessoa vai responder, “puxa, eu até gostaria, é tão lindo, mas não posso, ganha muito pouco....” ha, ha, ha...

Ano passado dei 35 aulas semanais. Para mim, percebi que é impossível fazer um trabalho pensado, crítico, transformador, nessas condições. A pessoa torna-se um proletário do ensino e rapidamente aliena-se de tudo, pois o cansaço é enorme, e fica-se frustrado. Ano passado não lia mais, mal preparava as aulas, e percebia, assustada, minha rápida progressão rumo à picaretagem absoluta. Porque dava aulas da quinta série do fundamental 2 ao segundo ano do ensino médio e simplesmente não tinha como preparar, de maneira refletida, pensada e crítica, tantos cursos e aulas. Esse ano trabalho metade disso, ganho metade também, mas ganhei em troca a possibilidade de tempo para reflexões como essa. Como ainda não tenho filhos e tenho uma família que me apóia e ajuda, pude fazer isso, mas sou exceção, e não teria que precisar fazer essa escolha, porque teria que, simplesmente, ganhar bem dando um número razoável de aulas, que me permitissem ter tempo apra corrigir os trabalhos dos alunos, preparar as aulas, estudar.

Todo professor, por obrigação de ofício, tem que ser um ser pensante e sensível, crítico, exigente, conhecedor de seu ofício e da matéria ensinada, seguro para não transferir suas frustrações pessoais para a relação com os alunos e capaz de se colocar no lugar do outro, percebê-lo, capaz de pensar em cada aluno como um ser vivente, com uma história própria. Todos alunos têm direitos a professores assim, todos os pais e mães querem professores assim para seus filhos, do CEO da empresa multinacional ao faxineiro da mesma empresa. De todos os direitos elencados aqui nesse manifesto, esse é o mais básico e o mais importante. Quando damos dez, doze, sei lá quantas aulas por dia, isso simplesmente não acontece.

Procura-se dignidade, e salário é coisa séria. Ganha-se mal, e ninguém tinha que trabalhar por idealismo. Educação, ali juntinho com a saúde, deveriam ser prioridades absolutas em qualquer política pública (e há outro tipo de política?). E não há como melhorar a qualidade da educação sem, primeiro, aumentar os salários dos professores; sem isso, não há computador, cursos, palestras ou prédios novos que resolvam. Educar é um ato humano, de gente com gente, e as gentes, todas, alunos, professores e funcionários, devem ser tratadas com dignidade. Há histórias de heroísmo, de trabalhos maravilhosos, fundamentais e exemplares feitos por gente abnegada e incrivelmente comprometida com o aprendizado, há ilhas de excelência de ensino, onde todos os alunos saem leitores críticos e etc. , mas são exceções que somente confirmam a regra. Os professores devem sim ser criticados, mas a solução para os problemas que existem tem que, necessariamente, passar por aumento de salário. Sem salário digno para os educadores, não é possível um sistema educacional que seja realmente bom.

O resto tudo é conversa.

3 comentários:

  1. Um amigo sempre me falou que o problema da educação, é que ocorreu uma mudança de classe! Os professores são pobres, ganham mal e não têm nenhuma, nenhuma dignidade!
    é isso mesmo!
    Perfeitíssimo!

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  2. Bravo! é muito gratificante ler seu manifesto, mas também confesso que muito frustrante porque nunca o discurso do político é colcoado em prática. não há orçamento baseado na capacitação, motivação, enfim , em salário. Já investimento em parceria com MIT é pauta nacional para educação. Uma pena! adorei te achar na blogosfera. Tenho portal destinado a mães e gostaria de fazer uma entrevista contigo linkando este texto perfeito no portal. topa?
    o portal é www.desabafodemae.com.br

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  3. Celia,

    adorei o seu portal, adorei a idéia da entrevista. Muito obrigada, é claro que topo!
    Um beijão.
    Lulu.

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