quinta-feira, 18 de janeiro de 2007

da obrigação de "estar bem"

É uma verdadeira lei social, todos temos que estar bem, o tempo inteiro. Estar bem, além de ser praticamente sinônimo de estar magro ou magra, também significa estar sorridente e simpático, cheio de trabalho ou cheio de projetos ( pelo menos cheio de projetos), namorando, ou pelo menos beijando na boca, casado, com alguém. Estar bem significa estar cheio de energia, disciplina e objetivos a serem atingidos e tal. Trabalhando muito, indo à academia, viajando nas férias, saindo com amigos... ai que sono que preguiça. Nada contra nada disso, mas... respondam-me caros leitores: quem fica bem a porra do tempo inteiro?

Pois aqui lanço um manifesto pelo direito de estar mal, sem que isso também provoque uma avalanche de preocupação e olhares consternados, e comentários do tipo: "ela/ele está tão mal... coitaadooo/a"; ou: "fica bem, já. Agora."

Ok, é horrível ver as pessoas que a gente ama, mal. E a gente não entende como que o nosso amor e presença absolutos não resolvem isso, mas às vezes, assim, de vez em quando, nada é suficiente, e o estar mal é meio necessariozinho, uma fase, uma necessidade.

Não estou falando de depressão nem nada disso, que são coisas sérias e não devem ser de modo algum romantizadas e sim tratadas, mas... do direito de acordar mal humorado, do direito de não querer conversar muito naquele dia, do direito de chorar meio sem motivo, e de simplesmente passar um dia meio melancólico, ou melancólica, olhando para o nada, sentindo um vazio, mesmo estando bem. Do direito de só querer colo, e não querer falar nada, do direito de se angustiar e até sufocar um pouquinho quem tá do nosso lado ( por uma dia só, tá? ) . Isso faz parte da nossa condição humana, desconfio muito das pessaos que são sempre felizes e estão sempre bem, mas... parece quase um pecado capital, de vez em quando, não estar bem.

Às vezes você tá mal, e pronto; ou está não-bem, e isso quase que deixou de ser socialmente aceitável. Ninguém também pode mais ficar doente, as farmácias de hoje em dia, nos bairros chiques de SP, parecem verdadeiras boutiques, uma coisa impressionante; os hospitais, hotéis cinco estrelas. A doença e a morte bem escondidas, disfarçadas, porque não combina. Não combina mesmo, mas... shit happens, e somos humanos e não super heróis. Uma pena... ou não. Fico achando que nossas fragilidades, medos, dores, são também o que nos tornam mais belos e interessantes. E que talvez, elas não precisem ficar tão escondidas.

Tenho um amigo que um dia me falou que amava começar a chorar e ir se olhar no espelho, chorando, que achava isso bacana e dramático no último. Dei risada e falei que fazia isso também, mas na adolescência, depois parei. Mas continuo achando divertido. E tenho uma amiga cujo namorado tirava fotos dela depois dela ter chorado muito, o nariz vermelho, os olhos inchados, ela está linda nas fotos.

E aquele dia que você passa inteiro de camisola pela casa, escova os dentes porque, vá lá, do contrário nem você se agüentaria, mas fica ali, de chinelo e meio despenteada, fazendo suas coisinhas, vendo Gilmore Girls ou Friends, um episódio em seguida do outro, o dia inteiro. Você e a gata, ou o cachorro, ou só você mesmo, ou até os dois.

E quando bate uma tristezinha que você nem sabe de onde vem, que fica ali, aguda, te deixando meio sem forças, e vc senta e escreve, ou sai um pouco, se dá um sapato de presente, vai fazer manicure, arruma os livros na estante e sei lá, depois melhora. Quando o tempo demora a passar e não há nada que o acelere, quando o dia é longo e doído. Quando vem de súbito uma saudades de alguém que vc perdeu, e não há o que fazer, a não ser vivê-la. Esses dias existem, não podem ser repetidos sempre, mas eles existem, e têm direito de existir, até para nos lembrar do que são os dias bons, e belos, e repletos e perfeitos.

A gente cai seis vezes e levanta sete, pega a vida pelas mãos, faz o maior esforço, e é assim mesmo, e assim que deve ser. Só não precisa ficar bem, estar bem, o dia inteiro, 24 horas por dia, porque graças ao bom deus não moramos no supermercado Pão-de-açúcar, lugar-de-gente-feliz ( tenho ódio dessa propaganda) , ou no espírito do Mc Donald´s amo muito tudo isso. Ai que medo. A gente cai, levanta, e vive, com dignidade, momento bons e momentos ruins. Que eles sejam mais bons que ruins, e que sejam, sobretudo, sinceros para a gente e nossos desejos e os de quem a gente ama.

Pronto. Pelo direito de estar bem, estar mal, estar mais ou menos, estar por aqui. Sem muito drama, meio distraidamente, nos divertindo e fazendo coisas no meio do caminho, que às vezes dão certo, às vezes mais ou menos, mas sei lá. Fico achando mesmo que o importante é o caminho e, nele, que possamos ser verdadeiros e fiéis a nós mesmos, contemporâneos de nós mesmos, como disse o Murilo Mendes.

E isso é mais difícil que "estar bem".


13 comentários:

  1. Por um momento cheguei a ficar preocupado com a possibilidade do evento de ontem ter catalisado esse post...

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  2. Ah, estou tendo alguma dificuldade com as alcunhas, mas estou chegando lá.

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  3. Que nada querido!! O evento de ontem foi uma delícia!! Esse negócio tav ana minha cabeça faz tempo. Eu quero ver mais animês, brincar mais com os transformers e beber mais daquelas coisas!!

    ;)
    mil beijos,
    Lulu.

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  4. Essa geração happy happy joy joy movida a Prozac devia ir pro espaço. Acho engraçado não poder chorar. Gente. Se as emoções existem, é pq podemos senti-las todas! Eu tenho vontade de dar um tiro em gente saltitante. Não rio à toa, meu riso é pra bem poucos. Se saltitar uma vez, toma tiro na testa.

    Eu amo ficar num momento glamour de camisolinha de Hello Kitty, jaqueta jeans(Pq é sempre a que tá perto qdo o frio bate), cabelo preso e chorando. Na frente do espelho. Sempre.

    Acho glamour ao máximo. Se os olhos estiverem borrados de preto, melhor ainda. Hoho.

    Beijo, Lululinda. k

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  5. tem toda razão Lu, essa síndrome de Teletubbies me deixa mal pra caramba.

    Até pq esse "não estar bem" de certa forma é o "vc olhar para si", sem esperar e muito menos precisar de opiniões alheias

    Tudo bem.....não preciso sair chutando o pau da barraca por este mundo a fora, afinal ninguém tem culpa do meu mau humor....mas dá licença, me deixa quieta, chorar, xingar......e se não querem ouvir saiam de perto..rss

    eu sou meio louca neste sentido, não gosto de reprimir muitos minhas emoções, outro dia falando ao celular no meio da rua com minha filha, ela começou a me irritar com suas argumentações sem sentido......quando eu vi as pessoas me olhando com os olhos arregalados...então percebi que estava literalmente gritando.

    o que eu fiz?... continuei gritando até escutar o tradicional: Tá bom mãe....já entendi.

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  6. Dulcinha e K,
    amei seus comentários.
    Lulu.

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  7. minha linda, nao me levem a mal vc e seus comentaristas... eu nao tomo drogas nem prozac nem gosto de teletubbies, mas estou sempre bem e feliz e nao tenho o menor saco pra essas pessoas que estao sempre mal, desesperadas, incompreendidas, com duvidas existenciais profundas, etc etc. sério, depressão pra mim é muito passé. não aturo. mando voltar quando estiver melhor...

    e sim, eu tb estou com saudades

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  8. Alex meu querido,

    depressão é, de fato, so last season... oh!!

    mas estar malzinha charmosa é outra coisa. ;)

    vamos resolver essas saudades ASAP.
    lulu.

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  9. Certa vez uns amigos foram a um evento empresarial. Só que ele era no Disney Resort, então entre uma palestras e outra eles perambulavam pelo Reino Mágico. Os dois não são, nas condições normais de temperatura e pressão, poços de alegria e felicidade, mas naquele momento estavam cheios de preocupação com trabalho, aquelas coisas. Andavam cabisbaixos e pensativos.

    Isso, para os funcionários e transeuntes do parque, contam eles, foi uma ofensa pessoal. Passavam por eles clamando. SMILE! SMIIIILE! Os caras, bons emos que são (mas não sabem que são) ficaram mais revoltados e cabisbaixo ainda. :-)

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  10. É muito satisfatória estar mal e se sentir bem no contexto proposto no primeiro paragráfo do post.

    Hoje mesmo estava pensando no BBB7, o estilo de vida proposto pelo programa é justamente este que você está combatendo, pode parecer conspiratório mas se fosse botar a culpa em alguem eu atiraria a pedra nas empresas que vendem sonho de consumo. Mas quem sou eu para atirar uma pedra ...

    Deixa pra lá, este discurso é velho.

    Estar mal e ser legal pra mim lembra Smashing Pumpkins e Nirvana, recomendo a todos ouvir 1979.

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  11. Olha, esse link eu acabei de receber de um grande amigo, pq eu estava me sentindo exatamente dessa forma q vc descreveu. Concordo plenamente com vc. O fato de ter um dia down não me torna uma pessoa infeliz. Muito bom o texto, adorei!Agora posso curtir minha "fossa" sem complexo de culpa! :)
    sds,
    Pamella

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  12. Pô Pamella,

    que legal. Obrigada, mesmo!!


    Cris,
    adorei a história da Disney, pô... dava uns tiros se um Mickey sorridente me mandasse sorrir e eu cheia de preocupações.
    KKKKKKK

    camino,
    ótima trilha sonora.

    :)

    beijos a todos,
    Lulu.

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